Olá Jovem Mulher, Hoje tenho o prazer de entrevistar uma jovem mulher, que conheci menina e tenho o visto ela desabrochar e crescer para a vida. De sorriso fácil, tenho que me lembrar
que já é uma mulher feita, sempre bem-disposta, muito focada, um orgulho de
menina. Vamos começar?
Vamos pedir a nossa entrevistada para fazer a sua apresentação.
- Quem é esta jovem mulher?
R: Eu sou a Neusa Pontes, jovem de 25 anos, Gestora de Projectos Digitais na
Fusion – Comunicação e Marketing, uma pessoa muito apaixonada por cinema e
televisão. - Como te defines hoje?
R: Me defino como uma pessoa muito persistente, que vai atrás da sua evolução
e luta para realizar os seus sonhos. - És jovem, formada e gestora de projectos digitais. Tudo isso aconteceu antes dos
25 anos. Há limites para mulheres como tu?
R: Não, não há. O limite é o céu e se ainda ninguém chegou lá, então devemos
continuar a buscar o que queremos aqui na terra. Já vi grandes pintores sem
braços, já vi um cego a tornar-se recordista de corrida. Não há limites para
mulheres como EU, nem para outras pessoas. - Valeu a pena teres abdicado da diversão para focares na formação?
R: Valeu sim, mas também nunca fui muito de ir à discotecas, bares, ideias de
festas todos os fins-de-semana, como a minha irmã (risos). Ninguém sabe o dia
de amanhã, mas acredito que cada coisa tem o seu tempo. Preferi ficar em casa a
estudar, me aperfeiçoando em algumas coisas no fim-de-semana, ao invés de
sair com os amigos.
Há pessoas que que tchilam do mesmo jeito que estudam e saem-se bem na vida,
outras não. Por isso, preferi não arriscar, porque sabia e sei que muita coisa na
minha família, depende de mim. Eu precisava manter o foco para mudar o rumo
da história. - Há espaço e tempo para levares uma vida com as diversões próprias da
juventude, fazer algo para ti mesma?
R: Mais ou menos. Às vezes acho que tinha que ter mais tempo para mim e para
me divertir (risos). O digital consome muito do nosso tempo e cérebro, por
estarmos a criar por quase 24h ao dia. Mas aos poucos tenho entendido melhor a
área e isso tem me ajudado a gerir melhor o meu tempo e me divertir um pouco,
às vezes. - A vida profissional tem um significado especial para ti?
R: Especial e grande. Há mais admiração e respeito agora, tanto no seio familiar,
entre amigos, vizinhança e profissionalmente. - Sei que já enfrentaste vários desafios e teve que ultrapassar grandes barreiras
para chegar à Neusa que temos aqui. Queres nos falar um pouco sobre a tua
história?
R: Estão a ver aquela pessoa que tinha tudo para dar errado, mas não deu? Eu
sou uma dessas. Meus pais se separaram quando eu tinha por aí 13 ou 14 anos e
a minha mãe ficou com toda a responsabilidade sobre nós (eu e mais 3 irmãos).
Meu pai sempre foi “bem angolano”, dividia-se entre a nossa casa e a das outras
mulheres, trabalhava, mas dificilmente nos apoiava.
No entanto, era quase sempre a minha mãe que tratava de tudo, alimentação,
roupa, saúde… às vezes a situação ficava difícil para a minha mãe dar conta de
tudo sozinha, ficou bem pior depois da separação, graças a Deus a minha mãe
sempre foi uma mulher de negócios, ao longo dos anos conseguiu construir
algumas casas, que arrendou mais os negócios que fazia dava para nos sustentar.
Mas as coisas não foram um mar de rosas! Quando a crise começou a apertar e o
preço dos bens básicos subiram, tudo ficou complicado para ela, foi obrigada a
vender as casas que tinha (ficamos apenas com a casa que vivemos) e isso foi
muito doloroso para ela e para nós. Pois às tinha construído com muito
sacrifício. Mas seguimos.
Eu fui para a faculdade, minha irmã terminou o ensino médio no curso de
enfermagem e os outros 2 irmãos também continuam a estudar. Por causa da
fase difícil que estávamos a passar, fui obrigada a vender doces e salgados no
primeiro ano da faculdade, e olha que não era próximo (da Gamek à Direita até à
Centralidade do Kilamba).
Eu levava todos os dias a minha caixa térmica dentro dum saco bonitinho
(risos). Se não tinha vergonha? Nenhum pouco, eu precisava de fazer aquilo para
garantir o dinheiro do táxi, e os meus colegas adoravam, pois na altura não
tínhamos um refeitório na faculdade e as cantinas eram distantes. Mesmo com
muito sacrifício terminei os estudos e os meus irmãos também nunca pararam de
estudar.
Fiz questão de ser sempre boa aluna, fazendo parte do grupo dos melhores, que
ao defender a monografia tive como nota 20 valores. Isso mesmo, 20 valores.
Foi um momento de glória para mim e a melhor forma de honrar a minha
guerreira mãe. Dois meses antes de defender a monografia já tinha encontrado
um trabalho, que me deu muito jeito para custear as despesas da monografia e
defesa, outras ajudas vieram dos meus tios, recebi muita ajuda financeira dos
meus tios nessa fase.
De lá para cá tenho estado a trabalhar e a fazer cursos. Divido com a minha mãe
as despesas de casa, se eu pago uma coisa, minha mãe paga outra. Uma vez a
minha mãe olhou para mim e disse: “minha filha, muito obrigada. Minhas
orações não têm sido em vão, plantei, agora estou a colher. Nunca pensei que
uma filha poderia me dar tudo aquilo que o meu marido nunca conseguiu me
dar. Continue a cuidar dos teus irmãos e que Deus te capacite e abençoe sempre”
… Fui para o quarto e chorei, pois, ouvir isso de uma mãe lava o nosso coração
e nos orgulha de uma maneira inexplicável. - Qual é o papel da tua mãe para a construção da Neusa de hoje?
R: Eu digo sempre: a minha mãe, a dona Noémia, é a nossa heroína do dia-a-dia
(minha e dos meus 3 irmãos). Alguém que dá até o que não tem para os filhos,
sacrifica-se dia após dias por nós. Eu simplesmente sou o que sou, porque não
aguentaria ser uma vergonha para ela, por tudo que ela fez e continua a fazer por
nós. - Há muitas dificuldades para te fazeres respeitar no território digital
“supostamente” masculino em que trabalhas?
R: Para ser sincera não. Já passei por duas empresas do ramo, agora estou na
terceira e nunca senti essa dificuldade. Penso que a dificuldade não é pelo facto
de se fazer respeitar no meio masculino, mas sim de entender a própria área que
está sempre numa constante e terrível evolução. Para mim esta é a dificuldade, e
não é só para as mulheres, para os homens também. - Na tua opinião, quais são as maiores dificuldades que as mulheres enfrentam
actualmente?
R: Como decidimos trabalhar não só na cozinha, então para mim as maiores
dificuldades que as mulheres passam é conciliar as tarefas de casa com as tarefas
do trabalho, ter tempo para si mesma, sair e se divertir com as amigas. - As mulheres têm se debatido com vários problemas de identidade e afirmação
social, fruto de traços históricos e culturais. Hoje, as mulheres tomam decisões
por si mesmas e optam por ir à escola e ter uma vida profissional fora de casa.
Qual é a sua opinião à respeito?
R: Hoje em dia, muitas mulheres já não correm atrás da sua validação numa
primeira instância, elas correm atrás da sua evolução, se ocupam demais em
cuidar da sua vida, estudar, trabalhar… e isso traz como resultado a
afirmação. - Qual é o maior desafio que uma jovem como a Neusa enfrenta na sua vida
diária?
R: Conciliar a vida profissional, com o tempo de diversão, juntamente com as
responsabilidades da vida adulta, ser a filha primogênita da Mãe e irmã mais
velha dos meus irmãos. Para mim, ser adulto já é um grande desafio, e ser mais a
irmã mais velha numa fase que os meus pais são separados, em que o meu pai
não dá sustento nenhum e a minha mãe faz negócios fora de Luanda, ficando
muito tempo longe nós. Para mim, isso tudo é desafiante para uma jovem de 25
anos que tem de ajudar a mãe a sustentar os irmãos e começar a organizar a
própria vida. - Existem limitações para as mulheres? Ou como diz o adágio “lugar de mulher é
onde ela quiser”?
R: Se há um ser com menos limitações nessa vida, é a mulher (risos). Mulher
cozinha, arruma, cuida das crianças, assiste TV e mais um milhão de coisas ao
mesmo. Mesmo doente, trabalha e cuida dos seus. Acham que lugar de mulher
continua a ser só na cozinha? Lugar de mulher é até onde ela não é chamada,
mas vai lá e faz acontecer. - O que mais a motiva, o que te faz inspirar e recomeçar?
R: Minha família (mãe e irmãos), a batalha diária da minha mãe, as lutas que
travamos, os meus sonhos e objectivos a alcançar. - Sente-se uma mulher realizada ou ainda tem metas a alcançar?
R: Eu orei por coisas que tenho hoje, ainda não é tudo, falta muito, mas
agradeço muito a Deus por ter me permitido chegar até aqui (jovem, formada e
profissional). Mas ainda não sou uma mulher realizada. Nem a metade da
metade das coisas que desejo alcançar consegui ainda. Continuamos na luta. - Que mensagem deixarias para as jovens mulheres que como tu, correm atrás
dos seus objectivos?
R: Que não parem, independentemente das circunstâncias. Vão sempre atrás do
que querem, deem sempre o melhor em tudo que fizerem, que a recompensa,
mais cedo ou mais tarde, chegará. Aliás, Deus não esquece dos seus filhos que
cedo madrugam. - Quer acrescentar alguma coisa que não perguntamos?
R: De momento não, tia Natália (risos). - Consideras-te uma pessoa feliz?
R: Sim, feliz e muito grata.