Existem mulheres cuja história ultrapassa fronteiras e revela ao mundo o poder de quem viveu na pele o que tantas outras apenas imaginam. Uma dessas mulheres é Angelina Vunge, angolana, ex-deputada no Parlamento do Uruguai, activista, e acima de tudo, humana — profundamente humana.

Angelina cresceu em Angola, numa casa onde a educação e o cuidado pelos outros eram valores fundamentais: o pai era médico, a mãe professora. Ainda jovem, viu a sua vida mudar abruptamente, forçada a deixar o país. Chegou ao Uruguai carregando pouca bagagem física, mas muitas perguntas, feridas abertas e uma coragem discreta, que só quem já passou por muito conhece.

Foi no Uruguai que tudo recomeçou — entre desafios diários, discriminação e a difícil adaptação a uma nova cultura, Angelina foi, aos poucos, reencontrando o seu lugar. Trabalhou, estudou, ouviu, e fez-se ouvir. Sem esquecer de onde vinha, começou a lutar por aqueles e aquelas que, como ela, sabiam o que era ser invisível.

“Não fui actriz de telenovela brasileira, mas vivi uma”, disse ela numa entrevista marcante ao El País — uma frase que resume, com ironia e verdade, os caminhos que percorreu.

Da escuta à acção

Com o tempo, o seu activismo tornou-se mais do que palavras. Tornou-se política. E, em 2019, foi eleita deputada pela Frente Ampla — tornando-se a primeira mulher africana a ocupar um cargo legislativo no Parlamento uruguaio. Durante o seu mandato, foi voz activa em temas ligados à imigração, igualdade racial, justiça social e direitos das mulheres.

Mas Angelina nunca se deixou consumir pelo cargo. A sua missão ia para além das estruturas políticas: tratava-se de representar vidas reais, experiências silenciadas, dores partilhadas.

“Sou uma feminista africana. A nossa luta tem uma base comunitária e espiritual. É colectiva”, afirmou.

Sofrimento como escola de vida

O que distingue Angelina não é apenas o cargo que ocupou, mas a forma como fez do sofrimento uma lição. “A dor foi a minha escola”, disse em entrevista à rádio Del Sol. E essa frase não é metáfora — é verdade vivida. Em vez de se deixar definir pelas circunstâncias, Angelina transformou-as em ferramenta de empatia, acção e mudança.

Hoje, fora do parlamento, continua envolvida em projectos sociais que apoiam mulheres migrantes, jovens negras e famílias em situação de vulnerabilidade. O seu trabalho é um legado vivo de escuta, coragem e reparação.

A vida depois da política: presença e propósito

Hoje, Angelina continua no Uruguai, envolvida em projectos sociais e de capacitação para mulheres negras e refugiadas. A sua história ressoa com muitas outras – angolanas que deixaram o país não por vontade, mas por sobrevivência, e que, mesmo assim, encontraram forma de florescer.

Angelina Vunge não fala apenas em nome próprio. Fala por muitas mulheres angolanas que, dentro ou fora do país, continuam a resistir, a reconstruir-se e a inspirar. A sua presença no mundo é um lembrete poderoso de que somos, todas, muitas vezes mais fortes do que imaginamos.

Um exemplo para Angola, para África, para o mundo

A história de Angelina Vunge merece ser contada, partilhada e celebrada. Não só pela sua coragem, mas pela sua clareza: não há democracia plena sem representatividade real. E nenhuma mulher deve ser silenciada pelo lugar onde nasceu, pela sua cor ou pela sua dor.

Conheces mais mulheres angolanas que estão a transformar o mundo fora do país? Envia-nos as suas histórias para: info@mulheres.ao — queremos contá-las.

 

Fontes:

  • El País – Planeta Futuro (2024). “Angelina Vunge, exdiputada angoleña en el Parlamento de Uruguay: ‘No fui actriz de telenovela brasileña, pero viví una’”
    Leia aqui

  • Rádio Del Sol – Abran Cancha (2024). “La historia de Angelina Vunge, la angoleña que tomó el sufrimiento como lección de vida”
    Leia aqui

 

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